C'est la Vie
- Thomas Bruno Oliveira
- há 8 minutos
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THÉLIO FARIAS, PRESIDENTE DA ACADEMIA DE LETRAS de Campina Grande, foi quem me alertou sobre o estado de saúde do nosso confrade Ednaldo Alves. Em determinada conversa em seu escritório, na última semana, acertamos que iríamos fazer uma visita. Na quarta pela manhã, Z’Édmilson me avisa e depois das 16h nos dirigimos para a casa de Ednaldo. Do escritório partiram Thélio, Z’Édmilson, Katiano ‘Cabo 70’ e Eduardo Gomes. Eu parti de casa. Nos encontraríamos lá, nas costadas da Igreja de Nossa Senhora de Fátima, no bairro da Palmeira.
Pego na surpresa de quem achou que a visita seria um pouco mais tarde, saí de casa sem nenhum presente, mas com a animação em finalmente reencontrar o amigo que só tinha visto antes da pandemia do coronavírus. Partindo de Bodocongó, tomei as vias entre nossas universidades federal e estadual, passei defronte a inesquecível Escola Redentorista e fui transmudado em pensamentos recordando muito do que vivi naquela prestigiosa escola técnica. Ali cursei parte de eletrônica e telecomunicações além do técnico em informática, isso no início do novo milênio. E já se passaram 25 anos.
Tomando o rumo do Araxá pelos novos acessos urbanos, rumei no sentido da Palmeira e me senti deslumbrado ao passar por baixo do pontilhão da linha férrea, sentimento parecido com a primeira vez que trilhei o caminho, eu bem menino junto a meu pai, em um velho Monza. Ali eu estava só, mas com ele no pensamento e as bandeirolas em algumas casas e ruas, me lembrava a proximidade de nossa maior festa e como o povo ainda se veste espontaneamente em louvor à festa dos santos juninos.

Subi a ladeira e fui chegando nas proximidades da antiga escola Santa Bernadete e a Igreja Nossa Senhora de Fátima. Procurei algum carro conhecido estacionado naquelas proximidades e vejo, através de um portão de ferro formado por uma colcha de losangos vazados, a presença dos confrades e amigos no jardim. Estaciono no meio-fio oposto. Animados e com o bom humor de sempre, eles conversavam e pareciam notar alguma informação junto a filha Elaine, enquanto Ednaldo Alves repousava em uma cadeira dessas de terraço junto ao portão. Ele percorria a rua com o olhar um tanto perdido, como a buscar um inadiável caminho para os novos desafios da idade. Dirijo-me àquela calçada e já rente ao portão ele dá conta da minha presença. Busca na minha feição uma maneira de me reconhecer e pergunta ao Thélio. Tentei disfarçar aquele momentâneo desalento; por ele, por mim, por nós, mas duas palavras trocadas e a magia de uma prodigiosa mente foi capaz de clarear o que a retina teimou em traí-lo. Assim, lembramos dos tempos em que o Diário da Borborema nos ofertou generoso espaço para a publicação de nossas ideias, ele sempre às terças-feiras assinando como “Dentista e historiador” e eu, ainda militando nos bancos da faculdade, escrevia aos sábados. Tinha o prazer em partilhar a rede de colunistas com escritores como Josemar Pontes do Ó, Adhemar Dantas e outros que davam o brilho cotidiano deste tradicional jornal, cujas portas da redação cerraram, infelizmente, no ano de 2012.


Lembrar de meu nome, de mim e de algum texto foi motivo de muita honra, assim como foi o recordar de nossos encontros no ‘Sebo de Ronaldo’ (O Cata-livros de Campina Grande). Ele sempre de branco, sapatos brancos, alguns livros apoiados por debaixo do braço e as intermináveis conversas, inclusive, algumas vezes, com o saudoso e querido doutor Virgílio Brasileiro. Jamais esqueço do que me disse no lançamento de seu livro ‘Guarabira: um olhar sobre o passado’ no longínquo novembro de 2007: “Thomas, historiador, continue escrevendo, admiro muito a história”. Celebrando essas lembranças e comentando a arte da escrita, ele aconselhou que era sempre importante se deter aos detalhes, o que a todo momento perscrutava em seus escritos. É memorável a iniciativa da Academia em honrar seus mais longevos membros.




Na glória de quem está prestes a completar noventa voltas no astro rei, emocionado e com olhos azeitados por uma mente eternamente juvenil, ele nos diz: “Ganhei o dia com essa visita...”. Refletindo sobre o que rege a nossa existência, em ato de contemplação, Ednaldo abre os braços como um orador que sempre foi e declamou para nós: “C'est la vie. C'est la vie”. Sorrindo o deixamos e, na verdade, quem ganhou o dia fomos nós. Assim é a vida Ednaldo, assim é a vida!
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Publicado na coluna 'Crônica em destaque' do Jornal A UNIÃO em 31 de maio de 2025.
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