C'est la Vie
- Thomas Bruno Oliveira

- 1 de jun.
- 4 min de leitura

THÉLIO FARIAS, PRESIDENTE DA ACADEMIA DE LETRAS de Campina Grande, foi quem me alertou sobre o estado de saúde do nosso confrade Ednaldo Alves. Em determinada conversa em seu escritório, na última semana, acertamos que iríamos fazer uma visita. Na quarta pela manhã, Z’Édmilson me avisa e depois das 16h nos dirigimos para a casa de Ednaldo. Do escritório partiram Thélio, Z’Édmilson, Katiano ‘Cabo 70’ e Eduardo Gomes. Eu parti de casa. Nos encontraríamos lá, nas costadas da Igreja de Nossa Senhora de Fátima, no bairro da Palmeira.
Pego na surpresa de quem achou que a visita seria um pouco mais tarde, saí de casa sem nenhum presente, mas com a animação em finalmente reencontrar o amigo que só tinha visto antes da pandemia do coronavírus. Partindo de Bodocongó, tomei as vias entre nossas universidades federal e estadual, passei defronte a inesquecível Escola Redentorista e fui transmudado em pensamentos recordando muito do que vivi naquela prestigiosa escola técnica. Ali cursei parte de eletrônica e telecomunicações além do técnico em informática, isso no início do novo milênio. E já se passaram 25 anos.
Tomando o rumo do Araxá pelos novos acessos urbanos, rumei no sentido da Palmeira e me senti deslumbrado ao passar por baixo do pontilhão da linha férrea, sentimento parecido com a primeira vez que trilhei o caminho, eu bem menino junto a meu pai, em um velho Monza. Ali eu estava só, mas com ele no pensamento e as bandeirolas em algumas casas e ruas, me lembrava a proximidade de nossa maior festa e como o povo ainda se veste espontaneamente em louvor à festa dos santos juninos.

Subi a ladeira e fui chegando nas proximidades da antiga escola Santa Bernadete e a Igreja Nossa Senhora de Fátima. Procurei algum carro conhecido estacionado naquelas proximidades e vejo, através de um portão de ferro formado por uma colcha de losangos vazados, a presença dos confrades e amigos no jardim. Estaciono no meio-fio oposto. Animados e com o bom humor de sempre, eles conversavam e pareciam notar alguma informação junto a filha Elaine, enquanto Ednaldo Alves repousava em uma cadeira dessas de terraço junto ao portão. Ele percorria a rua com o olhar um tanto perdido, como a buscar um inadiável caminho para os novos desafios da idade. Dirijo-me àquela calçada e já rente ao portão ele dá conta da minha presença. Busca na minha feição uma maneira de me reconhecer e pergunta ao Thélio. Tentei disfarçar aquele momentâneo desalento; por ele, por mim, por nós, mas duas palavras trocadas e a magia de uma prodigiosa mente foi capaz de clarear o que a retina teimou em traí-lo. Assim, lembramos dos tempos em que o Diário da Borborema nos ofertou generoso espaço para a publicação de nossas ideias, ele sempre às terças-feiras assinando como “Dentista e historiador” e eu, ainda militando nos bancos da faculdade, escrevia aos sábados. Tinha o prazer em partilhar a rede de colunistas com escritores como Josemar Pontes do Ó, Adhemar Dantas e outros que davam o brilho cotidiano deste tradicional jornal, cujas portas da redação cerraram, infelizmente, no ano de 2012.


Lembrar de meu nome, de mim e de algum texto foi motivo de muita honra, assim como foi o recordar de nossos encontros no ‘Sebo de Ronaldo’ (O Cata-livros de Campina Grande). Ele sempre de branco, sapatos brancos, alguns livros apoiados por debaixo do braço e as intermináveis conversas, inclusive, algumas vezes, com o saudoso e querido doutor Virgílio Brasileiro. Jamais esqueço do que me disse no lançamento de seu livro ‘Guarabira: um olhar sobre o passado’ no longínquo novembro de 2007: “Thomas, historiador, continue escrevendo, admiro muito a história”. Celebrando essas lembranças e comentando a arte da escrita, ele aconselhou que era sempre importante se deter aos detalhes, o que a todo momento perscrutava em seus escritos. É memorável a iniciativa da Academia em honrar seus mais longevos membros.




Na glória de quem está prestes a completar noventa voltas no astro rei, emocionado e com olhos azeitados por uma mente eternamente juvenil, ele nos diz: “Ganhei o dia com essa visita...”. Refletindo sobre o que rege a nossa existência, em ato de contemplação, Ednaldo abre os braços como um orador que sempre foi e declamou para nós: “C'est la vie. C'est la vie”. Sorrindo o deixamos e, na verdade, quem ganhou o dia fomos nós. Assim é a vida Ednaldo, assim é a vida!
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Publicado na coluna 'Crônica em destaque' do Jornal A UNIÃO em 31 de maio de 2025.


















"Ele percorria a rua com o olhar um tanto perdido, como a buscar um inadiável caminho para os novos desafios da idade".
"Na glória de quem está prestes a completar noventa voltas no astro rei [...]".
Depous de ler esse texto e, sobretudo, os dois trechos destacados acima, veio-me o seguinte pensamento:
Os insights existenciais que costumam brindar os marcos da passagem do tempo em nosso corpo fazem aflorar diversas sensações. Entre elas, assim como em seus textos, Thomas, vou escolher destacar aquelas que decorrem das presença das boas companhias e da exuberância serena do texto literário.